segunda-feira, 27 de julho de 2020

DINA TEREZA

 
Vedeta portuguesa por um só filme...
 



 
Após ter visto um documentário no canal RTP memória com a última entrevista da actriz portuguesa Dina Tereza, surgiu a curiosidade de escrever algo sobre a vida desta artista, um tanto esquecida e que está ligada a um importante facto da história do cinema em Portugal, o primeiro filme sonoro português. De seu nome completo Dina Moreira de Oliveira nasce no dia 24 de novembro de 1902, numa casinha modesta no lugar de Igreja freguesia de Oliveira do Douro em Vila Nova de Gaia. Nesse lar humilde vivia o casal Agostinho Moreira e Rosa Tereza de Oliveira, seus pais e mais dez crianças que faziam predominar a alegria naquela casa. É nesta casa que Dina Moreira vê pela primeira vez a luz do dia, e ali vive os primeiros anos de sua meninice, enquanto os seus pais, ele um modesto pintor, ela uma humilde costureira trabalhavam arduamente para que nada faltasse àquelas dez crianças. Um dia, a sua mãe lê um anúncio publicado no jornal "O Século" onde uma senhora inglesa do Porto se oferecia para educar e cuidar de uma criança órfã, prática habitual à época. Embora nenhuma das dez crianças o fossem, a mãe entrou em contacto com a dita senhora que aceitou criar uma das crianças. É assim que Dina Moreira de Oliveira, então com cinco anos de idade, em 1907, muda-se para o Porto, para os cuidados daquela benfeitora e é aí que tem pela primeira vez contacto com as primeiras letras. A jovem Dina Moreira, dona de uma excelente memória, não tardou em aprender tudo quanto mais tarde se lhe tornaria útil, inclusive os idiomas de inglês e francês. A par desses conhecimentos, a jovem Dina Moreira decorava os números que ouvia nos teatros, cantarolando e declamando de cor todos esses números teatrais, mostrando-se desde cedo, inclinada para a carreira teatral. Isso custar-lhe-ia algumas tareias, uma vez que a sua educadora considerava a arte teatral como o primeiro passo para a degradação, típico da mentalidade de outros tempos. Com a morte de sua benfeitora quando ela tinha apenas 13 anos, a jovem Dina retorna à casa de seus pais em Oliveira do Douro. Mas aquela vida de província, martirizava-lhe o espírito e consegue ir novamente para o Porto para casa de uma amiga da sua primeira bem feitora. As suas ambições alcançavam horizontes mais amplos. Por isso certo dia em 1917, com apenas 15 anos numa ida à fonte, uma amiga do local onde vivia que era corista no teatro, fala-lhe sobre tentar uma audição como corista no teatro. Aceita a ideia e após a audição é convidada a integrar o elenco como corista, deixando de imediato a casa desta sua última bem feitora, que também foi contra a ideia de se dedicar àquela vida, para ganhar o mundo que tanto ambicionava. Ia em busca daquilo que se tornara uma verdadeira obsessão no seu maior desejo, o mundo do teatro.



Ruralidade de Oliveira do Douro em Vila Nova de Gaia onde Dina Moreira de Oliveira nasceu
e foi criada no início do séc. XX (arq. priv.)

 
 
Dina Moreira de Oliveira tal como muitas crianças pobres da época,
vai viver com 5 anos para o Porto ficando aos cuidados e educada
 por uma senhora inglesa (arq. pess.)


Rua dos Clérigos no Porto em 1909, que Dina Moreira de Oliveira conheceu 
na companhia da sua educadora inglesa em 1909 (arq. pess.)
 
 
 
A jovem Dina Moreira com objectivos de
conquistar o seu maior sonho, o teatro
(arq. priv.)

 

Ensaio de coristas do teatro de revista no Porto em meados de 1917
(arq. pess.)

 
Coristas de teatro de revista do Porto num espectáculo em meados de 1917
(arq. pess.)
 
 
 
 
Em 1917, ano conturbado com a entrada de Portugal nas trincheiras da Primeira Grande Guerra Mundial, Dina Moreira de Oliveira com 15 anos, pisava o palco pela primeira vez no Teatro Águia D'Ouro, no Porto como corista a fim de participar nas revistas "Tenho Dito" e "Trunfo é de Paus", duas revistas que obtiveram apreciável sucesso. Passa então a adoptar o seu primeiro nome artístico, Dina Moreira. Iniciava-se assim a carreira artística da garotinha de Oliveira do Douro. Mas o seu sonho dourado começou a vislumbrar-se, o ballet, ela deixava-se ficar boquiaberta perante os passos coreográficos das bailarinas, numa admiração que, aos poucos, ia-se tornando um verdadeiro desejo de copiá-los. A actriz Esmeralda Ferreira leva Dina Moreira para a Companhia António Macedo, então apresentando-se numa das casas de espectáculo de Lisboa. Tudo indicava que Dina Moreira seria uma grande bailarina, mas uma enfermidade faz com que os médicos lhe imponham uma condição: submeter-se a uma delicada intervenção cirúrgica para poder seguir a carreira de bailarina, preferiu então, desistir da dança. No entanto em 1919, com 17 anos de idade, Dina Moreira vê-se chamada a substituir a vedeta do teatro de revista da altura, Laura Costa. Fá-lo com grande sucesso, razão de ser escolhida, meses depois, para preencher a vaga deixada pela actriz Tina Coelho na revista "Piparote", da Companhia do actor Otelo Carvalho, que estava em cena no Teatro Salão Foz, situado no Palácio Foz em Lisboa. Mais tarde em 1922 volta a este teatro contratada pela mesma Companhia, para a peça "Giga Joga". Volta depois para o Porto onde durante quatro anos trabalha ininterruptamente em diversos teatros, dando sempre nas vistas. Mas Dina Moreira sonhava com mais, então um dia, escreve para o empresário Rosa Mateus, solicitando a hipótese de um contrato para Lisboa. Este por sinal não demora na resposta, Dina Moreira é convidada pela actriz Adelina Abranches (1866 - 1945), para participar na revista à portuguesa "A Setúbal", em que encarna a figura do "Zé Povinho". O sucesso leva a que esta revista se mantenha durante largos meses em cartaz no Teatro da Trindade. Dina Moreira é convidada depois para integrar o elenco do Teatro Variedades no Parque Mayer em diversas revistas. É nesta altura que Dina Moreira passa então a adoptar o nome artístico Dina Tereza, possivelmente em memória da sua mãe, Tereza de Oliveira. Em 1928, na época do cinema mudo, a actriz tem a sua primeira experiência numa pequena participação, no filme "Fátima Milagrosa" do realizador Rino Lupo (1888 - 1936). Eram os "loucos anos 20", também por essa altura Dina Tereza já dava nas vistas no meio lisboeta da época em cafés, locais públicos e da moda, como as pastelarias Garrett, a Benard, muito frequentadas por gente da sociedade da época e artistas, o Palace Club ou o Club Maxim´s, entre outros locais. Sempre muito elegante e sem dispensar algo que fez dela seu sinal de marca, o cigarro, sempre uma fumadora, o que causava à época espanto e escândalo nos locais públicos que frequentava, ao qual ela ficava indiferente e provocava os mais conservadores.


Teatro Aguia D'Ouro no Porto onde Dina Moreira se estreou como corista (arq. priv.)



O sonho dourado por concretizar de Dina Moreira 
ser bailarina (col. pess.)



Anúncio à revista o "Piparote" onde Dina Moreira
 vem substituir mais tarde com grande êxito
 a actriz Laura Costa (arq. priv.)



Teatro Salão Foz, situado no Palácio Foz em Lisboa, onde Dina Moreira
se estreou em 1919 (arq. AML)



Sala do Teatro Salão Foz onde Dina Moreira se estreia em Lisboa (arq. pess.)




Teatro da Trindade em meados da década dos anos 20 do séc. XX,
onde Dina Tereza também passou largos meses em cartaz
(artq. priv.)



Teatro Variedades em 1928 onde Dina Tereza se estreia no Parque Mayer (arq. AML)



Dina Moreira passa a adoptar então o nome artístico
 de Dina Tereza (arq. priv.)



Ambiente da sociedade elegante e dos artistas que Dina Tereza frequentava
na pastelaria Garrett em 1928 (arq. AML)



Ambientes elegantes dos anos 20 onde Dina Tereza dava nas vistas no Club Maxim´s em Lisboa
(arq. pess.)




Por volta de 1930, quando se pensou na realização cinematográfica de "A Severa", a mais aplaudida de todas as obras de Júlio Dantas (1876 - 1962), o realizador português José Leitão de Barros (1896 - 1967), debruçou-se sobre uma verdadeira pirâmide de fotografias de candidatas para escolher a intérprete principal do seu primeiro fonofilme. Este que será o primeiro filme sonoro português. De entre todas as candidatas que concorreram, surpreendeu-o a de uma rapariga morena, com verdadeiro tipo de cigana, que se lhe afigurou digna de ser observada de perto, para tirar definitivas conclusões. Tratava-se de Dina Tereza, na altura a trabalhar no Parque Mayer, mais propriamente no Teatro Maria Vitória. Na presença do grande realizador português, a pretendente a estrela do cinema nacional prestou provas e Leitão de Barros confirmou a opinião que formara, Dina Tereza seria a intérprete principal do seu primeiro fonofilme e primeiro filme sonoro português. Esta rapariga bonita com as suas características físicas encarnaria a figura da cigana Maria Severa Onofriana, mais conhecida por Maria Severa, da obra de Júlio Dantas, que, anos antes, havia sido a coroa de glória da grande actriz Ângela Pinto (1869 - 1925). Nesta nova produção do filme "A Severa", produzido pela então Sociedade Universal de Superfilmes, os exteriores do filme foram rodados em Portugal (na região do Ribatejo, no Palácio Nacional de Queluz, na feira das Mercês, no palácio Fronteira e na Praça de Touros de Algés, engalanada à época de agosto de 1840) e concluído em Paris, nos estúdios da Tobis de Épinay-sur-Seine, onde se rodaram as cenas de interiores e todo o trabalho de sonorização e pós-sincronização. Dina Tereza e o restante elenco partem no comboio Sud-Express do Rossio com destino a Paris em 25 de janeiro de 1931 para dar continuidade aos trabalhos da produção do filme. Contam-se algumas peripécias ocorridas em Paris durante estas filmagens, desde que Dina Tereza terá tido um pequeno acidente, por ter sido atropelada por uma carroça, mas sem gravidade o que atrasou as filmagens, assim como o facto de quer Dina Tereza quer o restante elenco, terem tido dificuldades na gravação dos diálogos e canções neste novo sistema, pois as gravações eram feitas à parte das filmagens e sem público. A título de curiosidade ainda, Dina Tereza ganhava 150 escudos por dia. Durante esta estadia do elenco do filme em Paris, surgem dificuldades financeiras da produção do filme o que causou transtornos a todos os actores. Transtornos estes resolvidos depois da vinda do realizador Leitão de Barros a Portugal para conseguir financiamento e resolver as dividas pendentes. No entanto apesar de todas estas peripécias o primeiro filme sonoro português ficou concluído e pronto para estrear. Com tudo isto Dina Tereza, correspondera à expectativa e, apresentando um trabalho de valor, conquistou, num abrir e fechar de olhos, a admiração e a estima do público. No filme "A Severa", Dina Tereza para além de cantar, teve a oportunidade, ainda que por uma cena, mostrar alguns dos seus dotes de bailarina, num momento em que a personagem que interpretava, a cigana Maria Severa, dança de terra em terra para ganhar o seu sustento. Rapidamente a corista em que poucos haviam reparado, deu então nas vistas, impôs-se e quando voltou aos palcos, ia aureolada por um prestígio que a elevou a bom lugar no teatro ligeiro. Assim nasceu a primeira vedeta portuguesa por um só filme, do nosso cinema sonoro, tendo imortalizado os versos de Júlia Dantas, autor do romance "A Severa" e musicado por Frederico de Freitas (1902 - 1980):

"Oh! Rua do Capelão/

juncada de rosmaninho!/

Se o meu amor vier cedinho/

eu beijo as pedras do chão, /

que ele pisar no caminho!"…



Realizador português José Leitão de Barros 1896 - 1967 (arq. priv.)



A figura de Maria Severa idealizada na obra de Júlio Dantas
(arq. pess.)



Dina Tereza a trabalhar no Teatro Maria Vitória é a candidata escolhida
para o papel de Maria Severa (arq. priv.)



Entrada lateral do teatro Maria Vitória em meados dos anos 30 onde Dina Tereza trabalhava
 quando foi descoberta pelo realizador Leitão de Barros (arq. priv.)



Noticia da revista Ilustração, com os bastidores do filme "A Severa"
(arq. priv.)



Partida da estação do Rossio no comboio Sud-Express com destino a Paris
do elenco de actores do filme "A Severa" em 25 de janeiro de 1931
(arq. priv.)


Estúdios cinematográficos em Paris da Tobis de Épinay-sur-Seine no inicio do séc. XX
onde viriam a ser rodadas as cenas dos interiores do filme "A Severa"
com Dina Tereza entre 1930 e 1931 (col. pess.)



Dina Tereza durante a rodagem de uma cena do filme "A Severa" em 1931
nos estúdios da Tobis de Épinay-sur-Seine
(foto, espólio da família Leitão de Barros)
 


Dina Tereza na personagem Maria Severa
criada por Júlio Dantas no seu romance
 (arq. priv.)



Dina Tereza na personagem Maria Severa
no filme "A Severa" de Leitão de Barros
 (arq. priv.)



Dina Tereza na personagem Maria Severa e a marquesa
do fonofilme "A Severa" (col. BNP)



Dina Tereza na personagem que iria marcar a sua carreira, Maria Severa,
a protagonista do fonofilme "A Severa" (col. BNP)



Dina Tereza interpretando um fado numa cena do filme "A Severa" (arq. pess.)
 
 

Cena do filme "A Severa" com Dina Tereza como Maria Severa (arq. pess.)



Fotograma do filme "A Severa" com Dina Tereza na personagem Maria Severa
 numa dança cigana (arq. priv.)



Com Dina Tereza nasceu a primeira vedeta por um só filme,
do nosso cinema sonoro com a personagem Maria Severa
(arq. pess.)


Dina Tereza como Maria Severa e o Timpanas num evento promocional ao filme "A Severa"
na Praça do Comércio em 3 de junho de 1931(arq. priv.)



 
O filme "A Severa" estreou no Teatro São Luiz em Lisboa, ás 9:45 da noite do dia 18 de junho de 1931 e foi um enorme sucesso. Contou com a presença de Dina Tereza que foi aplaudida no camarote presidencial juntamente com o seu realizador Leitão de Barros. A propósito do dia da estreia, o jornal Diário de Lisboa escreveu: "A Severa desembarcou no Sud, levaram-na à presa para o palco do S. Luiz, a Alfandega pesou-a, a censura viu-a passar na tela, e, duas horas depois de ter chegado. A Severa era apresentada em recita de gala, com todas as honras devidas ao primeiro fonofilme português."
Toda a imprensa da época em Portugal e não só, escreveu sobre esta nova produção cinematográfica e da nova vedeta que havia nascido, Dina Tereza. A estreia do filme "A Severa" no Porto foi a 29 de junho do mesmo ano no Cine Teatro Águia D'Ouro, curiosamente no mesmo local onde Dina Tereza deu os seus primeiros passos nas lides teatrais. O filme "A Severa", não só teve enorme sucesso em Portugal como no Brasil, onde esteve mais de 6 meses em cartaz, tendo sido visto por cerca de 200 mil espectadores. No Brasil o filme "A Severa" teve estreia em 1933 no famoso Cinema Odeon do Rio de Janeiro e com grande destaque na imprensa da época. Como era habitual na época os temas musicais e canções das revistas eram publicados em partituras e vendidos pelas diversas casas da especialidade, também aconteceu com os temas deste primeiro filme sonoro "A Severa". O êxito do filme "A Severa" e das canções nele interpretados foi tal que a empresa discográfica His Master's Voice publica os temas principais do filme interpretados por Dina Tereza em discos produzidos em Barcelona a partir das gravações originais, durante o segundo semestre de 1931.


Cartaz de 1931 do fonofilme "A Severa" de Leitão de Barros
com Dina Tereza (col. priv.)



Anúncio da estreia em 1931 do filme "A Severa"
 no Teatro S. Luiz em Lisboa (col. priv.)


Teatro São Luiz em Lisboa onde estreou o filme "A Severa"
 no dia 18 de junho de 1931 (arq. AML)



Cartaz anunciando a estreia do filme "A Severa" em 1931
na cidade do Porto no Cine Teatro Águia D'Ouro
(col. priv.)



Anúncio à estreia do primeiro fonofilme português "A Severa"
no Cine Teatro Águia D'Ouro na cidade do Porto,
com Dina Tereza entre outros em 1931
(col. priv.)





Genérico do fonofilme "A Severa" de Leitão de Barros
com destaque para Dina Tereza, actriz principal
(arq. priv.)







Fotogramas do filme "A Severa" com a personagem Maria Severa
interpretada por Dina Tereza (arq. priv.)



Dina Tereza na capa da revista Ilustracão Portugueza nº 962
de 6 de setembro de 1931 (arq. priv.)




Anúncio da estreia em 1933 do filme "A Severa"
no Cinema Odeon no Rio de Janeiro
(col.priv.)
 


Cinema Odeon no Rio de Janeiro onde estreou o filme "A Severa"
 no Brasil em 1933 (arq. pess.)
 


Dina Tereza na capa da revista brasileira A Scena Muda
de 5 setembro de 1933 (col. priv.)



Capa da partitura o Novo Fado da Severa do fonofilme
"A Severa" de Leitão de Barros de 1931 (col. priv.)


Capa da partitura do Fado da Espera de Toiros do fonofilme "A Severa"
de Leitão de Barros de 1931 (col. priv.)



Exemplar de disco de 1931 da editora His Master's Voice com temas do filme "A Severa"
  interpretados por Dina Tereza (col. pess.)




                       Novo Fado da Severa interpretado por Dina Tereza no filme "A Severa"

                   

            
A já então famosa actriz e vedeta de cinema Dina Tereza 
no início dos anos 30 (arq. priv.)



Página da revista Cine nº 1 de 17 de maio de 1934
alusiva ao sucesso do filme "A Severa"
(col. priv.)




Animada pela aceitação de "A Severa" e cobiçada pelo empresário Francisco Serrador (1872 - 1941), Dina Tereza resolve cruzar o Atlântico em 1933, a fim de trazer os seus agradecimentos ao público brasileiro. A sua chegada constituiu um verdadeiro fenómeno nacional à época, milhares de fãs aglomeraram-se na Praça Mauá, na zona central do Rio de Janeiro, para saudar a estrela enquanto o Cinema Alhambra enfeitava-se para a receber num grande evento. A imprensa por sua vez, abria colunas em seu louvor, festejando-lhe a visita. Dina Tereza manteve-se quatro meses no Brasil, cantando para as plateias paulistas e carioca. Passa a adoptar o nome de Dina Teresa em vez de Dina Tereza, deixando de utilizar a escrita com "z". Em São Paulo, foi alvo de uma homenagem pelo Clube Português no célebre edifício Martinelli. Durante esse evento num chá dançante, cantou alguns fados, acompanhada pelo professor de guitarra José Cosme. No final, o grande actor brasileiro Procópio Ferreira (1898 - 1979), recitou um monólogo em tributo à artista lusa. Durante esse tempo foi alvo de diversas homenagens, entre elas a curiosa homenagem prestada pelo proprietário (um português) da Confeitaria Cavé na rua Sete de Setembro no Rio de Janeiro. Para comemorar a passagem da artista lusa pelo Rio de Janeiro, ele criou um novo sorvete denominado "sorvete Dina Teresa"! O tempo passou, porém, para a surpresa e curiosidade de muitos, o "sorvete Dina Teresa" permanece no cardápio da Cavé. Embora, actualmente, quase ninguém saiba explicar o porquê do nome deste sorvete… Sendo servido numa generosa taça de cristal com sorvete sabor creme, com chantilly azedo e fios de ovos Dina. Igualmente no mercado brasileiro surge uma marca de cigarros, os "Cigarros Dina Tereza", em homenagem à actriz, também ela sempre uma grande fumadora.
De regresso a Portugal ingressa na Companhia da actriz Maria das Neves (1895 - 1981), sediada no Teatro Maria Vitória no Parque Mayer, participando na revista "A Real". Participou durante toda a década de 30 em inúmeras revistas e operetas tais como: "Ai-Ló"; "Mexilhão"; "O Canto da Cigarra" (1931); "A Senhora da Saúde" (1932); "Peixe-espada", "Nobre Povo", (1935); "Areias de Portugal"; "De Capa e Batina"; "O Timpanas"; "Cantiga Nova", (1932); "O Pagode", entre tantas outras, em que as suas criações ficaram gravadas na memória de todos que a viram trabalhar. Durante este período de tantos sucessos, grava vários discos com os êxitos das revistas à portuguesa onde participou. Em meados de 1938 regressa novamente ao Brasil para uma participação na revista "Arre Burro!" no Theatro Republica no Rio de Janeiro ao lado da actriz Beatriz Costa (1907 - 1996). Não se demorou porém, é que outros compromissos reclamavam-na em Portugal. Um deles eram as filmagens de "A Varanda dos Rouxinóis", em 1938, do realizador Leitão de Barros, contracenando com o actor António Silva (1886 - 1971). O filme tem estreia em 1939,  mas infelizmente não teve a repercussão esperada, embora fosse filmado pelo mesmo realizador de "A Severa". Seria com o filme "A Severa", grande este êxito do cinema português, que Dina Teresa ficaria conhecida e sempre identificada com a personagem Maria Severa, mas apesar disso nunca conseguiu atingir o primeiro plano enquanto cantadeira.

 
Dina Tereza no Rio de Janeiro depois do sucesso do filme "A Severa"
em meados dos anos 30 (arq. priv.)



Anúncio do Cinema Alhambra do Rio de Janeiro com Dina Tereza
como grande atracção (col. priv.)


 
Homenagem a Dina Tereza em São Paulo pelo Clube Português
no célebre edifício Martinelli em 1933 (arq. priv.)



Confeitaria Cavé na rua Sete de Setembro no Rio de Janeiro
onde se comercializa o famoso "sorvete Dina Teresa"
em sua homenagem (arq. priv.)



Em homenagem à actriz lusa, o famoso "sorvete Dina Teresa" da confeitaria Cavé
na rua Sete de Setembro no Rio de Janeiro (arq. priv.)



Dina Teresa na capa da revista Cine nº1 de 17 de maio de 1934 (arq. priv.)



Vista aérea do Parque Mayer em meados dos anos 30 onde Dina Teresa já era vedeta (arq. priv.)
 
 
 
Dina Tereza numa criação da revista "Senhora da Saúde"
 no Parque Mayer (col. priv.)
 
 
Dina Teresa na personagem a cigana da opereta "O Timpanas" (arq. priv.)
 
 
 
Dina Tereza num personagem de um quadro da revista
 "Cantiga Nova" no Parque Mayer (arq. priv.)
 
 
 
 

Capas de partituras dos temas da revista "Cantiga Nova",
interpretados por Dina Tereza (col. priv.)



Dina Teresa, Nascimento Fernandes e Beatriz Costa
no Brasil em 1938 (arq. priv.)

 

Anúncio da revista "Arre Burro!" em cartaz no
Theatro Republica no Rio de Janeiro
(arq. priv.)



Cartaz do filme "A Varanda dos Rouxinóis"
com Dina Teresa em 1939 (col. priv.)



Dina Teresa num personagem do filme "A Varanda dos Rouxinóis" de 1939
(arq. priv.)



Dina Teresa numa cena do filme "A Varanda dos Rouxinóis",
contracenando com António Silva em 1939 (arq. priv.)



Dina Teresa na personagem que interpretou no filme
 "A Varanda dos Rouxinóis" de 1939 (arq. priv.)




Nos inícios de 1939, Dina Teresa parte para Moçambique, exibindo-se no famoso Casino Costa na cidade de Lourenço Marques. Na década de 1940, Dina Teresa, ainda em Moçambique, casou e fica a viver em África por uma temporada, mas com o fim do seu casamento que pouco tempo durou, regressou a Portugal. Novamente em Lisboa, participa em inúmeros espectáculos de revista. De entre elas destaque para a revista "Toma Lá Cerejas!" no Teatro Apolo em Lisboa onde fez parte do elenco juntamente com a fadista Berta Cardoso (1911 - 1997). Mais tarde empreende, em companhia da fadista Hermínia Silva (1907 - 1993), uma tournée de sucesso pelas províncias de Portugal. Finda essa tournée, e aceitando novo convite, regressa ao Brasil em 1951, com um contrato para cantar nos cinemas durante os intervalos e para participar em vários programas da Rádio Bandeirantes. Nesse mesmo ano de 1951 desfez-se de todos os bens em leilão que possuía na sua casa em Lisboa e partiu definitivamente para o Brasil. Definitivamente no Brasil Dina Teresa rapidamente conquista a simpatia dos rádio-ouvintes. O empresário brasileiro Ferreira da Silva, ao saber da presença de Dina Teresa no país, convida-a para integrar o elenco da revista brasileira "Pau de Arara" em 1952. Actuou ainda como fadista em diversos restaurantes típicos em São Paulo e no Rio de Janeiro. A sua popularidade em "A Severa" assegurou-lhe uma forte referência artística, onde quer que chegasse logo era reconhecida e aplaudida. Em 1966, a "Revista do Rádio" promoveu o retorno sentimental de Dina Teresa, apresentou-se na Rádio Vera Cruz e na TV-Rio, no programa de César de Alencar (1917 - 1990), onde cantou todos os fados do filme que a deixou famosa. Na época, pode rever os seus grandes amigos: Manoel Monteiro, Olivinha Carvalho, Gilda Valença e Éster de Abreu. Durante os anos 50 a impressa brasileira concede-lhe algum destaque em diversas reportagens. A partir daí seguiria uma carreira teatral de sucesso só regressando a Portugal no início dos anos 70 para visitar Lisboa e tratar da sua reforma. Desde que foi viver para o Brasil Dina Teresa viveu sempre no seu apartamento em São Paulo, alguns anos mais tarde já cansada da vida citadina e por questões de saúde muda-se para Poá no interior de São Paulo. Residiu durante mais de 20 anos no "Sítio Rosário". Lá estava cercada de lembranças da sua vida artística e pelos carinhos dos seus afilhados e vizinhos. Dina Teresa reaparece em 1971 numa entrevista para a RTP na rubrica "Um dia com...", onde relata alguns momentos importantes da sua vida e percurso artístico. Dina Teresa viveu o resto dos seus dias sem grande luxo, apenas com a parca reforma que conseguiu no início dos anos 70, enviada de Portugal. A vedeta guardava uma guitarra que lhe fora oferecida, em 1931, pelo Marquês de Lavradio. Manteve até ao fim da sua vida o seu único vício que era fumar. As saudades de Portugal iriam acompanha-la até ao fim, mas as da sua Lisboa, como ela dizia, essas ficaram para sempre como ficou patente numa das últimas entrevistas que deu a Reinaldo Varela, correspondente da RTP no Brasil, no documentário "Chorai, Fadistas, Chorai" em 1982. Nessa última entrevista Dina Teresa manifestou o seu grande gosto pela época natalícia e todas as tradições assim como o desejo de regressar a Portugal, à sua terra natal e sobretudo à sua "querida Lisboa...", mas não tinha "dinheiro" para a viagem e a estadia..., a parca pensão que recebia não lhe deu direito a realizar esse último sonho. Vivia modestamente em Poá com uma família, uns compadres, que muito a ajudaram na velhice. Foi em Poá que veio a falecer aos 82 anos, a 7 de abril de 1984, tendo sido sepultada no cemitério local. Com todas as peripécias, êxitos, grandes sucessos, glamour, dificuldades e uma velhice  modesta mas tranquila, foi a vida desta actriz portuguesa, vedeta por um só filme e quase esquecida por muitos portugueses. Em memória de Dina Teresa, foi dado o seu nome a uma pacata rua e praceta em Oliveira do Douro, Vila Nova de Gaia, cidade que a viu nascer.


Dina Teresa em 1939 aquando da sua partida para África (arq. priv.)



Casino Costa em Lourenço Marques onde Dina Teresa actuou por volta de 1939
(arq. priv.)



Dina Teresa na época dos espectáculos no Casino Costa
em Lourenço Marques no início dos anos 40
(arq. pess.)



Cartaz da revista "Toma Lá Cerejas!" no Teatro Apolo em Lisboa
com Berta Cardoso e Dina Teresa como atracções em 1941
(col. pess.)



Teatro Apolo em Lisboa em meados dos anos 40, onde Dina Teresa actuou
com sucesso na revista "Toma Lá Cerejas!", foto Horácio Novais
(arq.  Biblioteca de Arte Fundação Calouste Gulbenkian)



Foto autografada de Dina Teresa em finais dos anos 40 (col. priv.)



Anúncio do jornal Diário de Lisboa de 1951 de leilão
do recheio da casa de Dina Teresa aquando
da sua ida definitiva para o Brasil
(arq. priv.)
 


Notícia da presença de Dina Teresa no Brasil
(arq. priv.)



Anúncio da revista brasileira "Pau de Arara"
 com Dina Teresa em 1952 (col. priv.)



Dina Teresa com amigos e afilhados no Brasil em meados dos anos 50 (arq. priv.)



Dina Teresa em destaque na imprensa no brasileira em 1957 (arq. priv.)



Dina Teresa numa das suas actuações no Brasil em 1957
com a guitarra que lhe fora oferecida, em 1931,
pelo Marquês de Lavradio (arq. priv.)



Dina Teresa no Brasil já em meados dos anos 60 (arq. priv.)



Dina Teresa com amigo no Brasil em meados dos anos 70 (arq. priv.)



Dina Teresa no Brasil em início dos anos 70 reaparece numa entrevista para a RTP
na rubrica "Um dia com..." (arq. priv.)




 
Aspectos de Poá no interior de São Paulo para onde Dina Teresa se muda até ao final da sua vida
(arq. priv.)



Local onde se situa o "Sítio Rosário" para onde Dina Teresa se mudou até ao final da sua vida
 em Poá, São Paulo (arq. priv.)



Dina Teresa já retirada da vida artística numa das suas últimas entrevistas para a RTP no Brasil,
no documentário "Chorai, Fadistas, Chorai" em 1982 (arq. priv.)



Em memória de Dina Teresa, foi dado o seu nome a uma pacata rua e praceta
em Oliveira do Douro, Vila Nova de Gaia, cidade que a viu nascer
 (arq. pess.)








Texto:
Paulo Nogueira

 

Fontes e bibliografia:
Jornal, Diário de Lisboa de 19 de junho de 1931
Revista Ilustração, nº 133, 30 de junho de 1931
Revista Cine-Jornal, n.º 16, 3 de fevereiro de 1936
Revista da Semana, janeiro de 1952
Documentário, Um dia com... Dina Teresa, produção RTP, 1972
Documentário, RTP Brasil, "Chorai, Fadistas, Chorai" com Dina Teresa, produção RTP, 1982
Hemeroteca Municipal de Lisboa
Cinemateca Portuguesa