As referências simbólicas deste período do ano vêm de longe. Os romanos festejavam entre 30 de abril e 3 de maio as "Floralias", festa dos cereais e das flores. A Idade Média manteve viva a tradição, em comemorações pela "expansão da primavera" ou o "signo da alegria". Ainda no século XVI, surgiu a primeira associação da estação com o mundo do trabalho, quando legislações corporativas instituíram a jornada de trabalho de oito horas. Foi o caso da legislação de Filipe II, de Espanha (1527 - 1598), que estabeleceu este direito para os mineiros em 1573 e para os demais trabalhadores em 1593.
Celebrado anualmente em numerosos países do Mundo, o dia 1 de Maio também conhecido como o Dia do Trabalhador ou Dia Internacional dos Trabalhadores, sendo também um dia de feriado em alguns países do Mundo.Representação das "Floralias", segundo um quadro de Prosper Piatti 1899 (col. priv.)
Calendário de trabalhos agrícolas de Pietro Crescenzi, séc. XV
(col. priv.)
Pormenor de iluminura da Idade Média com trabalhadores e senhor feudal (col. priv.)
No século XIX, esta simbologia foi retomada pelo proletariado moderno, que começava a organizar-se. Antes mesmo da consagração da data, reivindicações trabalhistas inspiravam-se naquele período do ano. O movimento de padeiros irlandeses contra o trabalho nocturno e o dominical no século XIX resultou nos "comícios de Maio", como os descreveu Karl Marx (1818 - 1883). As condições de trabalho, que eram em muitos casos de autêntica exploração, nomeadamente desde o início da Revolução Industrial iniciada em finais do século XVIII, sendo os operários forçados a trabalhar 12, 14, 16 e mais horas por dia, num regime de brutalidades e privações, na indústria, comércio e agricultura, em ambientes sem qualquer condições para o trabalho; muitos não tinham ventilação e iluminação adequada, eram extremamente sujos, etc. . Nem crianças nem grávidas eram poupadas. O militante anarquista norte americano desse período Oscar Neebe (1850 - 1916), fez uma descrição do contexto da época na sua autobiografia:
“Eu trabalhava numa fábrica que fazia latas de óleo e caixas para chá. Foi o primeiro lugar em que vi crianças de 8 a 12 anos trabalharem como escravos nas máquinas. Quase todos os dias, acontecia de um dedo ser mutilado. Mas o que isso importa… Eles eram remunerados e mandados para casa, e outros tomariam seus lugares. Acredito que o trabalho infantil nas fábricas tenha feito, nos últimos vinte anos, mais vítimas do que a guerra com o sul, e que os dedos mutilados e os corpos destroçados trouxeram ouro aos monopólios e produtores.”
Exploração do trabalho infantil e feminino em tecelagem
no início da Revolução Industrial do séc. XIX (arq. pess.)
Karl Marx 1818 - 1883 (arq. priv.)
Aspectos da exploração do trabalho feminino e infantil em diversos sectores nos finais do sec. XIX (arq. priv.)
Mas tudo remonta ao ano de 1886 quando nos EUA se realizou uma manifestação de trabalhadores nas ruas de Chicago no dia 1 de maio, convocada pela Federação dos Trabalhadores dos EUA, manifestação essa que tinha como objectivo reivindicar melhores condições para os trabalhadores. A exploração desmedida, sem qualquer tipo de escrúpulos, do trabalho infantil e feminino era uma fonte suplementar de lucro para empresários e capitalistas. Pretendeu-se com esta manifestação a redução das horas de trabalho para 8 horas diárias, tendo tido a participação de milhares de pessoas. Nesse mesmo dia teve início uma greve geral por todos os EUA, três dias depois houve um pequeno levantamento que acabou em escaramuças entre manifestantes e polícia, com a morte de alguns manifestantes. No dia seguinte nova manifestação é organizada com protestos pelos acontecimentos ocorridos nos dias anteriores, tendo terminado com o lançamento de uma bomba para o meio da polícia que começava a dispersar os manifestantes, matando sete agentes. Por sua vez, a polícia abriu fogo sobre a multidão, matando doze pessoas e ferindo dezenas. Tais acontecimentos passaram a ser conhecidos como a revolta de Haymarket. O episódio desencadeou uma perseguição a líderes do movimento operário. Depois de um processo suspeito, com carácter marcadamente político, sete deles foram condenados à morte por enforcamento, um deles cometeu o suicídio antes do enforcamento e três remanescentes receberam sentenças de prisão, mais tarde em 1893 revogadas, quando o governador concluiu que todos os oito acusados eram inocentes.
Apelo ao manifesto de Haymarket em 1886 (arq. priv.)
Acontecimentos de Haymarket no dia 1º de maio de 1886 (arq. pess.)
Explosão de bomba durante a revolta de Haymarket em 1886 (arq. pess.)
Tiroteio da policia em Chicago sobre manifestantes em maio de 1886 (arq. pess.)
Confrontos na revolta de Haymarket em 1886 (arq. pess.)
Cena da execução de alguns dos chamados Mártires de Chicago (arq. pess.)
A 20 de junho de 1889 o congresso operário internacional, reúne em Paris e decidiu convocar anualmente uma manifestação com o objectivo de lutar pelos direitos dos trabalhadores e as 8 horas diárias. O dia 1 de maio foi escolhido como homenagem às lutas sindicais e aos "Mártires de Chicago". No ano de 1890 os operários americanos conseguem conquistar finalmente a jornada de trabalho das 8 horas. Em 1 de maio de 1891 numa manifestação levada a cabo no norte da França, a polícia dispersa a manifestação resultando na morte de dez manifestantes. Este novo drama vem reforçar este dia como um dia de luta dos trabalhadores, tendo sido proclamado meses depois em Bruxelas pela Internacional Socialista como dia internacional de reivindicação de condições laborais. Passa a ser um dia de feriado em vários países como na França em 1919 e mais tarde em 1920 também na Rússia, tendo sido este exemplo seguindo por muitos outros países, principalmente após a II Guerra Mundial. O dia do Trabalhador na Suécia foi
comemorado pela primeira vez em 1890, com manifestações e desfiles em 21
cidades. No Brasil o dia 1 de maio foi declarado feriado pelo presidente Artur
Bernardes (1875 – 1955), em 1925, apesar de já haver registos de manifestações
operárias antes desta data. De um modo geral este dia é uma data comemorativa
internacional, celebrada anualmente no dia 1 de maio em quase todos os países
do mundo, sendo feriado em muitos deles. Muitos países em todos os continentes
celebram o dia 1.º de maio com várias designações como Dia do Trabalhador, Dia
do Trabalho, Dia Internacional do Trabalhador ou Dia de Maio. Em países onde o
dia 1.º de maio não é feriado oficial, são organizadas manifestações nesse dia
em defesa dos trabalhadores. Em alguns países celebram o Dia do Trabalhador em datas
diferentes dias de 1 de maio, como na Nova Zelândia as celebrações ocorrem na
quarta segunda-feira de outubro, em homenagem à luta dos trabalhadores locais
que levou à adopção da jornada diária de 8 horas diárias antes da greve geral
que resultou no massacre nos Estados Unidos, é designado Dia do Trabalho. Já na
Austrália o Dia do Trabalho varia de acordo com a região. Nos Estados Unidos e
Canadá celebram o Dia do Trabalho na primeira segunda-feira de setembro.
Alega-se que esta escolha nos Estados Unidos foi feita para evitar associar a
festa do trabalho com o movimento socialista, então com alguma relevância no
país.
Gravura de Walter Crane de 1894 em solidariedade aos anarquistas
de Chicago, executados após a Revolta de Haymarket
(col. priv.)
Luta dos trabalhadores pelas 8 horas diária de trabalho (arq. priv.)
Cartaz da Rússia, alusivo ao dia 1 de Maio de 1919 (col. priv.)
Rapidamente as comemorações do 1º de Maio chegaram igualmente a Portugal e os trabalhadores portugueses assinalaram-no logo em 1890, o primeiro ano da sua realização internacional. Mas neste dia os trabalhadores limitavam-se inicialmente a comemorar com cortejos e alguns piqueniques de confraternização, com discursos pelo meio alusivos ao dia e algumas romagens aos cemitérios em homenagem aos operários e activistas caídos na luta pelos seus direitos laborais. Tradição esta que se iria manter até ao início do século XX. Os operários portugueses sempre comemoraram activamente este dia com a solidariedade internacionalista, reclamando junto do patronato e das autoridades portuguesas o estabelecimento das 8 horas de trabalho diário e a melhoria das suas condições de vida e de trabalho.
Cortejo das comemorações do dia 1º de Maio de 1897 na Praça dos Restauradores em Lisboa (arq. pess.)
Multidão durante as comemorações do dia 1º de Maio de 1897 no antigo Largo de Camões
actual D. João da Câmara no Rossio em Lisboa (arq. pess.)
Concentração de trabalhadores portugueses em Santos-Lisboa em 1910 exigindo os seus direitos (arq. priv.)
Manifestação do 1º de Maio de 1913 no Porto (arq. priv.)
As comemorações do 1º de Maio deste ano de 1919 em Lisboa, ficaram marcadas por um comício no Parque Eduardo VII que contou, segundo registos da época, com cerca de tinta mil participantes. Em 1919, após algumas das mais gloriosas lutas do sindicalismo e dos trabalhadores portugueses, foi finalmente conquistada a lei das 8 horas de trabalho para os trabalhadores do comércio, da indústria e dos transportes. Mesmo em tempos complicados e difíceis de crises económicas e sociais como foram estes do pós Primeira Grande Guerra Mundial, alguns dos objectivos dos trabalhadores portugueses foram alcançados. Durante o período do Estado Novo apesar das proibições e repressão houve por diversas vezes manifestações de trabalhadores de diversas áreas. Como marco na história do operariado português ficaram as revoltas dos assalariados agrícolas dos campos do Alentejo no 1º de Maio de 1962, que até então trabalhavam de sol a sol.
Só a partir do ano da revolução do 25 de Abril de 1974, 6 dias após a manhã da liberdade, há 41 anos precisamente, é que se volta a comemorar livremente o dia 1º de Maio, organizado pela Intersindical criada em 1970 e este dia passou a ser feriado nacional. Neste dia há 41 anos, fizeram-se as maiores comemorações do dia 1º de Maio que há memória em liberdade e na nova democracia que estava a nascer. Era a consagração popular do dia 25 de Abril. Cerca de 500 a 600 mil pessoas nas ruas de Lisboa, talvez um milhão em todo o País (numa população de nove milhões), sem um único incidente a registar. Conseguem-se a partir daí profundas transformações económicas e sociais, conquistam-se liberdades e direitos fundamentais, melhorias nas condições de vida e de trabalho dos operários e suas famílias.
Comemorações do 1 de Maio de 1919 em comício operário no Parque Eduardo VII em Lisboa
in Illustração Portugueza (arq. pess.)
Comemorações do dia 1º de Maio em 1919 em Beja pelos ferroviários portugueses
da Companhia de Caminhos de Ferro do Sul e Sueste (arq. priv.)
Comemorando com cravos um Portugal livre em 1974 (arq. priv.)
Imagens do 1º de Maio de 1974 em Lisboa, comemorado em liberdade
(arq. priv.)
Comemorações do primeiro 1º de Maio no Barreiro em 1974 (arq. priv.)
Imagem da manifestação do 1º de Maio de 1974 na Alameda em Lisboa (arq. priv.)
Capa da revista O Século Ilustrado alusiva ao primeiro 1º de Maio livre de 1974
(col. pess.)
Página do jornal Diário de Noticias de 1974
alusivo ao 1º de Maio (arq. priv.)
Este dia 1º de Maio, é comemorado por todo o País com manifestações, comícios e festas de carácter reivindicativo promovidas pelas centrais sindicais CGTP (Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses), Confederação fundada a 1 de outubro de 1970 em Lisboa e UGT (União Geral dos Trabalhadores), Central Sindical fundada a 28 de outubro de 1978 em Lisboa. Nalgumas zonas do país organizam-se festas e piqueniques. As comemorações do 1º de Maio, em honra dos "Mártires de Chicago" e da luta de gerações e gerações de revolucionários, muitos deles sacrificando as suas vidas contra a exploração capitalista, constituem uma imponente jornada internacionalista de unidade e de luta por uma sociedade mais justa, fraterna e solidária, sem exploradores nem explorados. Uma importante comemoração mundial de hoje e de sempre.
Celebra-se igualmente neste dia em Portugal, o Dia da Mãe, que, seguindo a tradição da Igreja Católica, neste mês celebra Santa Maria, Mãe de Jesus (em particular Nossa Senhora de
Fátima), embora durante muitos anos tivesse sido comemorado no dia 8 de
dezembro, dia da Nossa Senhora da Conceição. Esta mudança das comemorações para o primeiro dia do mês de maio em Portugal, aconteceu no início dos anos 70 do século XX. Os países africanos lusófonos PALOP,
por influência, celebram igualmente o Dia da Mãe no primeiro domingo de maio. De salientar ainda, que no calendário litúrgico se celebra neste dia a memória de São José Operário, por se tratar do santo padroeiro dos trabalhadores.
Manifestação do dia 1º de Maio em Lisboa em 2012 (arq. priv.)
Manifestantes desfilando no 1º de Maio (arq. priv.)
Manifestação do 1º de Maio no Porto em 2013 (arq. priv.)
Comemorações do 1º de Maio de 2014 em Lisboa, foto Nuno Ferreira Santos (arq. PUBLICO)
Comemorações do 1º de Maio de 2014 junto à Alameda em Lisboa (arq. LUSA)
Comemoração do Dia da Mãe em Portugal numa representação
da "Maternidade" ou Mão de Jesus
por Roberto Ferruzzi em 1897
(col. priv.)
Fontes e bibliografia:
LIMA, Sebastião de Magalhães, O primeiro de Maio, Casa Bertrand-José Bastos, Chiado Lisboa, 1894
DEL ROIO, José Luiz. O 1º de Maio, Cem Anos de Luta. 1886-1986. São Paulo: Global, 1986
Organizado pelo Centro de Memória Sindical
DOMANGET, Maurice. Historia del Primero de Mayo. Buenos Aires: Editorial América, 1956
THOMAS, Michael, May Day in the USA: A Forgotten History. Oscar Neebe. Autobiography
Sem comentários:
Enviar um comentário