Situado num local isolado, muito ventoso, considerado por alguns místico, de uma beleza natural única na encosta da Serra de Sintra junto ao mar, que tanto tem de belo como de tenebroso, o Forte do Guincho, também denominado de Forte das Velas ou do Abano, localiza-se sobre o maciço rochoso em posição dominante sobre a praia do Abano na Freguesia de Alcabideche no Conselho de Cascais. Constitui, entre outros, mais um exemplo da arquitectura militar ao estilo maneirista do século XVII. Mandado construir no reinado de D. João IV (1604 - 1656), por D. António Luís de Menezes (1596 - 1675), enquanto Governador das Armas da Praça de Cascais, a partir de 1643, na época pós-Restauração, tendo sido responsável por esta e outras obras de reforço da Barra do Tejo. Esta edificação será, possivelmente, da autoria dos engenheiros militares, o holandês João Paschasio Cosmander (1602 - 1648), ou do francês Charles Lassart, ambos chamados a Portugal pelo rei D. João IV para ajudar na construção de fortificações no reino durante a Guerra da Restauração (1640 - 1668). O Forte do Guincho ou das Velas, foi edificado a partir de 2 de janeiro de 1642, integrando o conjunto das fortalezas que formavam uma cintura defensiva na costa de Cascais. Tinha como objectivo esta fortaleza a defesa da costa, servindo, sobretudo, para vigia do mar, cruzando fogos com a Bataria da Galé, fortificação também existente na zona do Guincho, inviabilizando qualquer desembarque naquela parte da costa. Dai esta pequena fortificação, assim como as demais existentes na região, fazerem parte das Batarias de Artilharia de Costa da Barra do Tejo. Construído sobre o maciço rochoso, a sua planta é rectangular, dividida em dois espaços distintos, a plataforma da bateria voltada para o mar, área de maiores dimensões, que albergava inicialmente sete peças de artilharia e a casa forte, de menores dimensões, virada para terra, que correspondia aos alojamentos dispostos em torno de um pátio. As suas fachadas de uma grande sobriedade e o frontispício é apenas rasgado por uma porta de armas com um arco de volta perfeita, estando encimado pelas armas de Portugal e a coroa do reinado de D. João IV. Como será fácil de imaginar, os militares destacados para esta fortificação, neste local ermo, viviam num enorme isolamento durante longos períodos e longe do convívio com a sociedade.
Rei D. João IV 1604 - 1656 (col. priv.)
Aspecto da costa de Lisboa e Cascais no séc. XVII/XVIII (col. pess.)
D. António Luís de Menezes 1596 - 1675 (col. priv.)
Planta do Forte do Guincho ou das Velas
levantada em 1796, pelo Sargento mor
Maximiano José da Serra (arq. priv.)
Aspecto geral do Forte do Guincho ou das Velas (foto Rafael Direitinho)
Aspecto do frontispício do Forte do Guincho ou das Velas (foto Rafael Direitinho)
Aspecto do Forte do Guincho ou das Velas na falésia para o mar (foto Paulo Nogueira)
Peças de artilharia idênticas às da bateria do Forte do Guincho ou das Velas no séc. XVII (arq. priv.)
Soldado português do período da Guerra da Restauração
como os que terão feito serviço
no Forte do Guincho ou das Velas
(col. priv.)
Aspectos da porta de armas do Forte do Guincho ou das Velas (foto Paulo Nogueira)
Pedra com as armas do reinado de D. João IV e placa alusiva a edificação,
sobre a porta de armas do Forte do Guincho ou das Velas
(foto Paulo Nogueira)
Sobre a porta de armas do Forte do Guincho ou das Velas e por baixo do brasão de armas de D. João IV, existe uma placa já carcomida pela erosão onde ainda se poder ler algo como:
D. [ANTÓNIO] L[U]IS DE MENEZES
CONDE DE CANTANHEDE DE S[EU
CONSELHO DE ESTADO] E GVERRA DE
[SUA MAGESTADE VEDOR] DE SVA FAZ[ENDA E G]OV[ERNADOR] DAS ARMAS [DE] CAS[CAIS] MANDOU FAZER ESTA [FORTIFICAÇÃO] O 1 DE DC[?]
CONSELHO DE ESTADO] E GVERRA DE
[SUA MAGESTADE VEDOR] DE SVA FAZ[ENDA E G]OV[ERNADOR] DAS ARMAS [DE] CAS[CAIS] MANDOU FAZER ESTA [FORTIFICAÇÃO] O 1 DE DC[?]
Aspecto geral do Forte do Guincho ou das Velas vista de terra (foto Paulo Nogueira)
Vista das falésias da praia do Abano e o Forte do Guincho ou das Velas ao longe
(foto Paulo Nogueira)
(foto Paulo Nogueira)
Com o Grande Terramoto de 1755 e com o Maremoto que daí resultou, o Forte do Guincho ou das Velas, terá sofrido alguns danos tal como os ocorridos na Vila de Cascais, no entanto nos séculos XVIII e XIX esta edificação foi reformada em diferentes campanhas de obras de melhoramentos e adaptação. As mais importantes obras desta fortificação aconteceram por volta de 1793, quando a plataforma rochosa em que o forte assentava ameaçou a desmoronar-se. Procedeu-se, então, a um reforço significativo das muralhas, sendo o embasamento rochoso "contrafortado" (reforçado), por um paredão de cantaria, ainda hoje visível. No decorrer dessas mesmas obras, o interior da fortaleza foi restaurado com algumas alterações da sua organização espacial, como se pode verificar na planta desta fortificação de 1798 feita pelo Segundo Tenente de Engenharia João da Mata Chapuzet (1777 - 1842). Manteve ainda assim uma pequena guarnição militar até 1832, ano em que foi desactivado e abandonado, quando o exército miguelista abandonou a região de Lisboa. De referir que esta fortificação desde então nunca mais foi ocupada pelo exército. Tal como a maior parte das fortificações entre Cascais e Lisboa, o Forte do Guincho ou das Velas, nunca participou em nenhuma operação defensiva significativa, funcionando apenas como um elemento dissuasor. Depois de desactiva esta fortificação terá sido ainda arrendada, por diversas vezes, a particulares. Em 1934 o Forte do Guincho ou das Velas, passou para a posse do Ministério das Finanças, embora posteriormente tenha sido cedido ao Clube Nacional de Campismo em dezembro de 1944, passando a funcionar como Casa-abrigo. Para essa nova função, o forte sofre algumas obras de restauro que pouco interferiram na traça original. Como curiosidade, enquanto Casa-abrigo, foi bastante utilizado, tendo mesmo sido escolhida, devido à sua situação privilegiada, por alguns jovens casais de campistas para local de lua-de-mel. Em 1970 esta actividade foi interrompida naquela edificação, quando esta foi cedido à Guarda Fiscal que ali pretendia instalar um posto fiscal, o que nunca veio a acontecer. Já no ano de 1977, um ano depois de devolvido aos campistas, o edifício foi assaltado e pilhado por desconhecidos, segundo notícias da época. Tendo o Forte do Guincho ou das Velas sido classificado como imóvel de interesse Público em 1977, foi entregue à Câmara Municipal de Cascais em 2003. Na actualidade esta pequena fortaleza encontra-se desocupada, sendo visível o seu estado ruinoso e quase ao abandono. Esta prevista no entanto a sua recuperação pela autarquia, prevendo a instalação no local de uma cafetaria e de um núcleo de divulgação do Parque Natural Sintra-Cascais, tendo sido elaborados alguns projectos. O Forte do Guincho ou das Velas, (ou ainda do Abano) é visível para quem circula na estrada junto à praia do Guincho. De alertar no entanto que se trata de um local que pode ser visitado por quem ali se deslocar, mas com as devidas precauções, pois trata-se de um local de acesso um pouco problemático, sem segurança alguma e que pode oferece grandes perigos por se situar numa falésia sem protecção alguma.
Planta do Forte do Guinxo ou das Velas, desenho aguarelado
por João da Mata Chapuzet em 1798 (arq. DSFOM)
Aspecto do Forte do Guincho ou das Velas e o paredão construído em 1793
(foto Paulo Nogueira)
Aspecto lateral do Forte do Guincho ou das Velas e o paredão construído em 1793
(foto Paulo Nogueira)
(foto Paulo Nogueira)
Aspecto de espaço circundante do paredão do Forte do Guincho ou das Velas
(foto Paulo Nogueira)
Pormenores da construção e reconstruções do Forte do Guincho ou das Velas
(fotos Paulo Nogueira)
(fotos Paulo Nogueira)
Um aspecto da vista do Forte do Guincho ou das Velas para o mar (foto Paulo Nogueira)
entre 1762 e 91 in Uniformes de Vários Regimentos séc. XVIII (arq. AHM-DIV)
Peça de artilheria de 9 libras idênticas às utilizadas no Forte do Guincho ou das Velas no séc. XVIII (arq. priv.)
Figurinos de uniformes do antigo Regimento de Cascais e
Forte do Guincho ou das Velas em 1806,
Forte do Guincho ou das Velas em 1806,
in Uniformes Militares, edição da Revista “Defesa Nacional”,
desenho de Carlos Ribeiro, s.d. (arq. AHM-DIV)
Aspecto do Forte do Guincho ou das Velas visto do mar em meados dos anos 60 (arq. priv.)
desenho de Carlos Ribeiro, s.d. (arq. AHM-DIV)
Aspecto do Forte do Guincho ou das Velas visto do mar em meados dos anos 60 (arq. priv.)
Acesso do paredão no Forte do Guincho ou das Velas e encosta da Serra de Sintra como fundo
(foto Rafael Direitinho)
Aspecto lateral do Forte do Guincho ou das Velas (foto Rafael Direitinho)
Aspecto do interior do Forte do Guincho ou das Velas na actualidade (arq. priv.)
Vista aérea do Forte do Guincho ou das Velas (Google maps)
Texto:
Paulo Nogueira
Fontes e bibliografia:
LOURENÇO, Manuel Acácio Pereira - As fortalezas da Costa Marítima de Cascais, Cascais, Câmara Municipal, 1964
MOREIRA, Rafael - A arquitectura militar in HISTÓRIA da Arte em Portugal, Lisboa, Alfa,1988
Sítio da Câmara Municipal de Cascais
Sítio da Junta de Freguesia de Alcabideche
IPPAR
Sítio da Câmara Municipal de Cascais
Sítio da Junta de Freguesia de Alcabideche
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Muito interessante!
ResponderEliminarGrato pela partilha!
Muito obrigado pelo comentário e pela apreciação deste trabalho.
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Fui neste lugar hoje. É incrível e lindo. A imponência desse forte. Eu fiquei encantada, vim ler e aprender um pouco mais. Obrigado pelas informações.
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